Creio que o vislumbrei através do espaço dos
castigos:
o sótão, a parede, a sala vazia das escolas
e colégios.
E também as igrejas e o quartel, que eram
outras formas de punição.
Devo ter-me portado muito mal - como diz
quem se porta bem - para a minha formação lhes ter merecido tantas atenções.
Depois aprendi outros silêncios:
a vastidão das fazendas, em Salgueirais, a
solidão dos montes alentejanos, a parada do
quartel, em Santa Margarida.
Quando comecei a fugir, às vezes parava o
carro e saía para ouvir a noite.
Mas a única vez que me senti perto do
silêncio, foi em Aragão, no meio dos Montblancs.
Ao contrário do que me disseram, ou julgava
ter ouvido, a morte é a coisa menos silenciosa.
Pelo menos, a avaliar pelos vivos.
Dizem, ou melhor, acusam-me cada vez com
mais frequência, que estou a ficar descompreendido.
Se calhar, julgam eles, para me pouparem o
desgosto de estar a ensurdecer.
Quem me conhece, sabe como cultivo essa
espécie de autismo, onde julgo encontrar-me com o silêncio.
Mas, embora silenciosa, não creio que a
surdez seja a via do silêncio.
Jorge
Fallorca em Longe do Mundo
Legenda: não foi possível identificar o autor/origem da fotografia.
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