quarta-feira, 30 de agosto de 2017

ACREDITAR NO ALUNO


O Barradas tinha lágrimas nos olhos. Eu falara-lhe com uma voz pequenina, que não ralhou nunca. Disse-lhe que tenho confiança nele e tenho mesmo. O Amor converte os pecadores, quanto mais o Barradas que é um rapazinho manso e bom!
Primeira lei: acreditar no aluno. Se o campo é bom e se a semente é bem lançada, até uma inicial vontade de enganar a contraria, agindo no espírito do aluno a nossa fé. E depois há o ficar ou não ficar tranquila a nossa consciência. Suponhamos, fora da escola, que um homem me diz: «Venho a pé do Algarve à procura de trabalho. Estou morto de cansaço e de fome e gastei os últimos cobres. Tenho vergonha de pedir esmola». Suponhamos agora que eu lhe digo: «Se não se importa, eu dou-lhe alguns escudos. Não +e esmola, nem é talvez «dar» a palavra que devia empregar, porque isto é um empréstimo: amanhã posso eu precisar e outro me há-de socorrer; me há-de pagar a dívida que o senhor contraiu comigo». Pois bem: «Tu és um trouxa» - poderão dizer. «Foste no conto do vigário e o homem ri-se de ti, enquanto come o teu dinheiro». E que me importa? Prefiro arriscar-me a «ser levado» a arriscar-me a deixar um homem morrer de fome. Sou levado, mas fico lavado. O que me enganou é que não.

Sebastião da Gama em Diário

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