Falando de discos,
vão para um teatro para crianças que se está organizando, segundo penso. E
também empréstimo. Comigo, levo apenas quatro ou cinco de música russa e os
dois de jazz que a Dietlinde me ofereceu uma vez… (Sou tão romântico que até
gosto de conservar recordações. Que bom!) Deixo cá todos os que suponho que ela
gostava: Bach, Mozart, Beethoven, canções de Natal, cancões alemãs e,
evidentemente, os discos de música brasileira que eu caí na arara de comprar.
Bem, M.ª Isabel,
creio que não estou a fazer nada ilegal, nem a prejudicar a futura venda que
irá enriquecer a minha quase ex-esposa. Tudo foi emprestado… creio que ainda me
resta o direito de emprestar aquilo que foi uma parte grande de mim durante
muitos anos. Quando quiser, é só pedir e tudo volta. Não alterei a fortuna do
unido casal nem espoliei ninguém… apenas ajudei alguns a terem,
temporariamente, um pouco mais de direito à vida…
E é tudo no que
respeita à casa. O resto cá está, mas a casa já não é nada. Morreu. Creio que
era isto que a Dietlinde queria. Ao raspar-se de casa, declarou-me que não
queria nada. Depois, pediu a viola. Levou a viola. Em seguida discos e livro.
Levou discos e livros (aliás, tudo, incluindo a viola, ficou por cá, à guarda
da Branca). Depois a m´quina de costura. Teve a solene afirmação, por mim
feita, que a máquina era dela. Depois começou a querer mais coisas e agora
conseguiu o que queria, conforme o bom processo hitleriano: tudo. O Hitler
também não queria mais nada depois da Áustria, não queria mesmo mais nada
depois dos Sudetas, nadíssima mais depois de Dantzig até que… apanhou a
indigestão da Polónia. O diabo é que este sistema dá quase sempre como
resultado a chegada de uns senhores chamados russos até Berlim. Não há dúvidas
que sou muito parvo; em certa altura devia também ter resolvido zangar-me e ir
até Berlim da minha jovem
Discípula de
Hitler. Bem, mas adiante…
(…)
A propósito de
partida: gostaria muito, mesmo muito, de ainda conseguir tomar uma bebida
consigo, antes de meter os pés ao desastre. Mas, M.ª Isabel, não creio isso
muito provável. Vou num cargueiro, trabalhando na conferência de carga. Foi uma
manigância que arranjei para poder ir, pois estou em falência quase fraudulenta. Como sabe, mais
uma das minhas múltiplas loucuras ´+e ser também possuidor de Cédula Marítima
de Praticante de Comissário. Portanto, estou legal. Se o cargueiro não chegar,
cá estarei; se alguém me prender, também cá estarei. Senão, vou no dia 14. Com vento
sul e mar encapelado… e confesso-lhe que muito chateado e sem acreditar nada no
que vou fazer.
É assim.
Escreva-me ainda
uma vez, se lhe sobrar tempo e lhe der prazer. Gostaria bem de a ler acerca de
Londres e dos seus entusiasmos.
Diabo, M.ª Isabel,
você vai fazer-me falta… Parece estranho, não parece?
De longe um dos
maiores abraços que tenho arranjado ultimamente, agora para si
Mário-Henrique
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