Neste livro de Correspondência, pertence a Eugénio de Andrade a primeira carta pós-25 de Abril. Não tem dia. Apenas: Maio de 1974:
O meu silêncio começa a ser escandaloso, mas tem as suas razões,
algumas que conheces, outras que ignoras. Antes de 25 de Abril tive o mais
íntimo dos meus amigos preso pela Pide, e depois do movimento das Forças
Armadas, houve uns dias de bebedeira.
O tempo quase não chegava para a leitura dos jornais, as emissões de rádio, a televisão.
Durante uns dias este país foi outro: agora é necessário encontrar-se um ritmo,
o que não é fácil. O processo democrático, ao nível dos organismos, das
fábricas, das escolas, é para já uma batalha. É evidente a falta de hábito. Não
tardará que a Junta de Salvação comece a ter também os seus presos políticos: a
esquerda revolucionária já está a ser aproximada pelos bem-pensantes do país,
incluindo os comunistas, da mais sinistra reacção.
(…)
Não tomes a mal o meu silêncio, o país começa a estar quase todo em
greve, e isso é muito inquietante.
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