Em 1926 sucedeu o que tinha de suceder, mais ano menos
ano, para pôr cobro ao desassossego em que se vivia: a instauração de uma
ditadura. Tinha este vosso tetraavô então a bonita soma de vinte anos. A
ditadura prolongou-se até 1974, o que significa que esteve instalada em
Portugal durante 48 anos! Foi demais para a nossa inquietude mas justifica-se
tão dilatado tempo por duas fortíssimas razões que, conjugadas, permitiram esse
resultado: uma, foi a simultaneidade de outras ditaduras em países europeus;
outra, foi o surgimento inesperado de um homem monolítico, nem de torcer nem de
quebrara, possuído de uma filosofia política firmemente assente nos valores
tradicionais da Nação (Deus, Pátria e Família), provinciano de quatro costados,
homem sem mulher, que usava botas com atacadores. Sobre a pressão dessas
botas pôs o país em silêncio enquanto as cabecinhas dos portugueses
assomando na periferia das gáspeas erguiam os olhos para o seu salvador.
Chamava-se, o homem, António de Oliveira Salazar. Era
natural do Vimieiro, no concelho de Santa Comba dão, e mestre de Economia e
Finanças na Universidade de Coimbra.
Notem, meus queridos tetranetos, que Salazar não se
esgueirou por entre as massas para alcançar a ribalta política. Ele estava
sentado na sua cátedra, a debitar os seus saberes, quando os ditadores
militares de 1926, já desorientados com a sua própria revolução, lhe suplicaram
que viesses até Lisboa tornar conta da pasta das Finanças, pois tinham notícia
da sua competência e a nau portuguesa estava prestes a afundar-se. O homem
veio, aceitou o cargo e apresentou o seu plano de acção governativa. As
exigências do seu programa eram muitas e pesadas e, como não foram aceites,
Salazar pôs o chapéu na cabeça e voltou para Coimbra. Cerca de dois anos mais
tarde, como a confusão continuasse na mesma, tornaram a chamá-lo. Que viesses,
que fizesse o que quisesse. Ele veio e fez o que quis, com a consciência
tranquila.
Rómulo de
Carvalho em Memórias
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