quarta-feira, 27 de setembro de 2017

OLHAR AS CAPAS


A Longa Espera

Mickey Spillane
Tradução: Almeida Campos
Capa: Lima de Freitas
Colecção Vampiro nº 134
Livros do Brasil, Lisboa s/d

O autocarro chegou ao cimo da ladeira e em frente apareceu Lybcastle pousada num vale escuro, como um estojo de jóias com a lua a brilhar lá dentro. À distância, as avenidas e ruas eram como fitas salpicadas de luzes e tubos néon, um brilho enganador que se prolongava para além da meia-noite, juntamente com os gritos e movimentos de uma alegria falsa, produzida pelo álcool.
Tirei a cartata da algibeira e rasguei-a em mil pedacinhos: em seguida abri a janela e atirei por ela os fragmentos que se perderam na noite.
A mulher gorda que se encontrava atrás de mim espetou-me um dedo no ombro.
- Se não se importa – disse ela -  gostaria que fechasse essa janela.
A interpelação foi feita com uma ar de professora a dirigir-se a um menino mal educado.
- E eu gostaria que a senhora fechasse essa boca – foi a minha resposta.
Fechou-a. Durante toda a jornada não deixara de criticar tudo: desde a maneira como o motorista conduzia o autocarro até ao barulho que fazia a criança do banco da frente, mas desta vez fechou a boca tão firmemente que nem se lhe viam os lábios.
O último pedaço da carta foi levado pelo vento e eu pensei que se alguém conseguisse juntá-lo aos outros fragmentos que se haviam espalhado pelo espaço de um quilómetro, encontraria uma razão poderosa para a morte de outro alguém.
Deixei a janela aberta na esperança de que o vento fizesse voar o chinó da mulher gorda e só a fechei quando o autocarro entrou na central de camionagem, situada no mesmo terminal que servis de estação de caminho de ferro.

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