Atravessando o
Paraíso
Sam Shepard
Tradução: José Vieira de Lima
Capa: Fernando Felgueiras
Difel, Lisboa, Fevereiro de 1997
Era uma coisa que
lhe dava sempre náuseas, fazer as malas. Aquela comichão indistinta a espreitar
na garganta. A boca a saber a algodão. Bastava-lhe ver a roupa interior e as
meias estupidamente à espera dele na cadeira. A pilha de T-shirts desbotadas. Estava-se nas tintas para a
ordem segundo a qual as roupas iam para o saco verde. Misturava-as a esmo e
nunca pensava no que poderia precisar de tirara primeiro ou em que cidade
poderia para na primeira noite. Para dizer a verdade, agora não fazia ideia
nenhuma sobre a direcção a seguir ou sobre a estrada que havia de tomar. Era
cara ou coroa. Tentou imaginar um destino: Lexington; El Paso; Boulder City.
Não fazia ideia. Os destinos misturavam-se todos. Tentou ver-se a si mesmo lá.
Algures num sítio qualquer. A chegar. Albuquerque, talvez. Tucumcari. Viu uma
cafeteira Denny’s que lhe parecia familiar, para lá de um parque de jogos e de
uma velha estação dos caminhos de ferro; mas não estava certo quanto à cidade
onde se lembrava de os ter visto ou quanto ao que esses sítios teriam que
justificasse o seu regresso. Pensou em queimar todos os seus mapas.
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