Cada um
come do que gosta.
Gostos não
se discutem.
As paixões
também não, mas isso não me impede de dizer que nunca compreendi a paixão
assolapada que o Pulido Valente desenvolveu entre gentes diversas, mais
concretamente entre jornalistas.
Eu às
voltas com os comeres iguais em todos os dias dos temos cinzentos e amargos, o
meu avô a dizer: «O menino não gosta, põe
à borda do prato».
Nunca gostei de Vasco Pulido Valente.
Numa
carta-aberta-resposta-ao-Vasco, o Eduardo Prado Coelho a escrever (Março de 1974, outro século) que é fácil
estar de acordo com as ideias de Vasco Pulido Valente «porque ele não tem
muitas».
Na resposta
o Vasco, já na condição de ex-colaborador do Cinéfilo, escreveu ao Eduardo:
«Fiquei informado de que sou parolo,
ignorante, e superficial, de que a minha esperteza excede em muito a minha
inteligência, de que os meus escritos me não dão autoridade para falar e de que
tenho poucas ideias.»
Também no Cinéfilo, já Pulido Valente polemizara
com a jornalista e escritora Maria António Palla, que o mimoseara com um «intelectual-português-valente encartado por
Lisboa e Oxford».
Em local
que agora não consigo lembrar, Pulido Valente deixou dito em entrevista: «a minha vida é uma tragédia de
oportunidades perdidas.»
Recentemente saiu um livro de conversas, gravadas pouco tempo antes de morrer, de Vasco Pulido Valente com o jornalista do Diário de Notícias João Céu e Silva – Uma Longa Viagem com Vasco Pulido Valente. Depois de outas viagens com José Saramago, Álvaro Cunhal, António Lobo Antunes, ao jornalista pareceu «que o cronista mais notável do último meio século em Portugal seria um tema adequado».
Notável cronista, considera João Céu e
Silva, corroborado pelo crítico do Expresso
Luís M. Silva.
Do muito pouco que conheço de Vasco Pulido Valente, deu para concluir que era um tipo ressabiado com o mundo, com os homens, com a extraordinária família onde calhou nascer.
Legenda: pormenor da página da revista do Expresso.
3 comentários:
E um grande "fantasista", para não lhe chamar outra coisa, Sammy.
Era capaz de escrever coisas sem pés nem cabeça, colocar em causa pessoas, apenas porque lhe apetecia "circular em sentido contrário".
Não me lembro é de o ver retratar-se.
Já li todos estes livros do João Céu e Silva – "Uma Longa Viagem com..." e achei-os excelentes.
Ainda não li este do Vasco Pulido Valente, mas estou curioso e quero lê-lo, também.
Caro Luís: só se retrata quem tem valores ou quem tem ideias, como dizia o Eduardo Prado Coelho.
Este génio da banalidade, há muitos e muitos anos, teve uma coluna no suplemento literário do «Diário de Notícias» a que chamou «Os Livros da Minha Vida». Um dos livros era os «Esteiros», com capa e desenhos de Álvaro Cunhal, e conta que sua mãe, Maria Helena Pulido Valente, comprou o livro em Dezembro de 1941. Ele só o leu em 1953 ou 1954 e «aprendeu que havia «nós» e havia «eles»: os que conheciam e se importavam com Gineto e Gaitinhas, e os que não conheciam nem se importavam. Apesar de longas peregrinações, continuo a ser de «nós» e não «deles» e, à medida que envelheço, cada vez gosto menos «deles».
O episódio serve para marcar, para além de outras, as muitas razões por que não gosto do «génio» e não perceber a enorme corte de admiradores,
Num dos capítulos dos filmes de Coppola, ouve-se Corleone dizer que não se deve cuspir no prato onde se come.
Caro Seve: este tipo de livros são interessantes, boas ferramentas para conhecer os autores com quem o jornalista viaja. Apenas tenho o de José Saramago que comprei quando foi editado. Sobre Lobo Antunes e sobre Álvaro Cunhal não os comprei quando editados, já os tenho encontrado em alfarrabistas mas pedem-me este mundo e o outro e tenho passado à frente. Sobre Pulido Valente, motivos óbvios da minha parte, dado já era caríssimo.
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