15 de Agosto de 1974
As pessoas esquecem-se (os propagandistas esquecem-se) de que, antes, de pregarem a sua «redenção» têm de pregar a validade dela. É o que está acontecendo com os grupos de jovens que se espalharam pelos recantos do País a levar a alfabetização. «São comunistas», clamaram os caceteiros dos tempos do D. Miguel. E o povo fechou-lhes as portas. Teria razão? Mas mesmo que não clamassem. Antes de alfabetizar, é necessário provar a excelência do alfabetismo. O povo não sabe para que serve ler. O animal também não. É uma ingenuidade, por exemplo, promover o povo da pocilga em que vive à casa limpa em que se deve viver. Quem ama a casa limpa, é quem tem um espírito limpo em que essa casa se coordene com mil outros valores. O que é necessário é revelar-lhe esses valores. É por isso que muita gente em «bairros de lata», podendo viver num andar decente. Simplesmente, para esse «proletário», não é a casa que é um valor: é o carro (em quinta mão), a TV, o bom vestuário, o futebol e a borracheira. Valorizar a casa é ter hábitos de casa: convívio familiar, leitura, isolamento. A casa para o «proletário» é apenas o lugar onde de noite se cuida da demografia e não se apanha (muita) chuva.
Vergílio Ferreira em Conta-Corrente Volume I
Legenda: recorte de um jornal de Abril de 1999, em que
o editor desconhece o título do jornal, bem como o autor da prosa.
O Dicionário de Morais diz de engaço:
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