18 de Março de 1974
O livro de Spínola alastrou numa revolta militar frustrada. O livro? Há um clima de inquietação, um cansaço do provisório em que vivemos. O difícil da questão é que solução alguma se nos impõe como boa. Há que escolher a menos má. Qual? A África é dos pretos que «exploramos» há quinhentos anos. Exploramos? Só? Mas como aguentar o embate da separação? O recurso seria retroactivo: termo-nos preparado para isso. Mas Salazar, como certos bichos, o que segregou foi pedra. Dizem-me: o Marcelo quer aguentar a guerra até estarmos preparados. Mas o desgaste não vai mais depressa do que a preparação? Tentamos acumular de um lado, enquanto gastamos do outro. Qual o saldo? Entretanto, ainda se recorre à retórica imperial. «Deus manda combater, não vencer», diz Marcelo. Mas Deus manda o que lhe mandamos mandar. Deus de paz, Deus carniceiro, Deus celeste ou terreno. O Deus de Marcelo não é muito inteligente. Ou estará simplesmente enrascado, sem saber o que fazer.
Vergílio Ferreira em Conta-Corrente em Volume I
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