13 de Setembro de 1991
Num texto do JL, sobre a nova mitologia cultural europeia,
Eduardo Lourenço retoma o velho tópico de que apenas fomos felizes no lugar
suspenso de uma infância irrecuperável. Quantas vezes não o ouvi dizer, e
talvez, sonâmbulo, o tenha repetido? De quando em quando, na fórmula mágica da
teoria: a infância é o espaço do Outro.
Sou sensível, como o
não seria?, à ressonância intelectual destas formulações, com uma ressalva, que
talvez explique tudo, isto é, nada: nenhuma perda, nenhuma relação de
nostalgia, nenhum dilaceramento visceral, me liga à infância. Que foi feliz,
sim, acho que sim. Mas a única infância verdadeiramente feliz foi a que me
acompanhou pela vida fora – até hoje, até amanhã de manhã. Se tenho algum
trabalho, é o de merecê-la – dia a dia. Pouco a pouco, fui-me sentindo capaz
disso: um desprendimento, uma desenvoltura, uma isenção (sentar-me na relva,
rodeado de vida por todos os lados, e olhar a vida a ver-se a si mesma). A
minha infância é afinal o pressentimento quotidiano do que tem efectivamente
importância.
(Talvez uma excepção,
mas insistente: o dia em que festejavam o dia dos meus anos.)
Por vezes, ao fim da
tarde, andando por aqui, nestas ruas do Marais, pergunto: não será esta a minha
mais bela recordação de infância?
Eduardo Prado Coelho em Tudo o Que não Escrevi
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