Um dia, já Abril tinha sido há algum tempo, há-de ouvir alguém dizer: «Vocês foram felizes no fascismo!» Ouvirá um outro-alguém responder: «Não! Fomos felizes contra o fascismo!»
Se bem que o poeta lhe tenha ensinado que saudades, só do futuro, há-de
muitas vezes sentir imensas saudades dos companheiros do 24 de Abril. Face ao
país irrespirável, com o peso da religião, os tribunais plenários, o
colonialismo, a guerra, a Pide, era gente generosa que acreditava, que não
ambicionava nada mais que a liberdade e o fim de uma guerra estúpida e inútil.
Sim, uma imensa saudade desses companheiros de 24 de Abril, possivelmente o
último dia em que ainda nos respeitámos. Depois, não imediatamente, há-de
confrontar-se com uma série de sucedidos que o levarão a não mais acreditar em
coisas em que acreditou. O Mário-Henrique Leiria a dizer: «Vê lá tu, que o
Álvaro Guerra deixou de me falar só porque não sou do partido dele!...»
Enquanto ouvia Beethoven, José Saramago dizia que quando nos julgassem bem
seguros, cercados de bastões e fortalezas, os altos muros ruiriam em grande
estrondo e chegaria o dia das surpresas.
Sim, o dia de muitas surpresas. Uma delas foi ver tanta gente nas ruas.
Onde estava toda esta gente, agora a dar vivas à liberdade, quando nos sabíamos tão poucos os que lutaram contra a ditadura?
Saberá mais tarde, que demasiados erros, demasiadas distracções, demasiadas ingenuidades, mergulharão o país num mar largo de clientelismo, da partilha do poder, de corrupção, do salve-se quem puder…
Trinta e cinco anos depois, perguntam-lhe que é feito daquele sol que uma
madrugada trouxe, essa madrugada que pensávamos estar bem gravada no calendário
dos nossos sonhos. Não encontra resposta, talvez não queira fazer um esforço
para a encontrar. Lembra apenas que houve um tempo em que foi feliz e que de há
muito vive a ressaca desses dias.
E não por acaso saltam-lhe as palavras de Simone Beauvoir:
«É horrível assistir à agonia de uma esperança.»
25 de Abril de 2009
Legenda: um 1º de Maio antes de Abril. Fotografia tirada do blogue O Castendo de António Vilarigues
1 comentário:
Recordar é viver.
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Um Sábado feliz
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Pensamentos e Devaneios Poéticos
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