10 de Junho de 1967
Faz hoje trinta anos exactos que fui
preso, a primeira vez pela polícia do fascismo – ao tempo, a P.V.D.E. É dia
comemorativo! Assinalá-lo abrindo nele este diário, que será de reflexões ou
apontamentos e não de factos, pois foi o perigo destes que me fez evitar o gosto do
jornal íntimo. Se nunca houve carta ou rabisco que os cães de fila não
esquadrinhassem à lupa! Entre prisões (5) e buscas (3), quantas recordações não
perdi, voluntária ou involuntariamente! Até o diarismo, companheiro e
confidente da frustração, foi boicotado…
Envelhecer é desvalorizar o futuro dum
ponto de vista pessoal. E reganhar, de certo modo, o passado. Se estas linhas,
escritas entre duas consultas, podem ajudar-me a encher o vazio do imediato,
por que evitá-las, hoje? Bem se me dá que as levem ou as destruam! Não deixarei
nelas o que quer que seja que prejudique terceiros.
Passei estes anos a preparar uma maturidade inútil, descubro-o agora: no plano social, procurando condições políticas que, realizando as aspirações gerais, viabilizassem as minhas; no plano intelectual, adquirindo uma utensilagem que estruturasse uma intervenção idónea. Com a saúde que resta e o tempo que nunca sobra, já pouco ou nada poderei fazer, mesmo que as condições mudem a tempo. O que foi foi, não o discuto, nem o deploro. Nunca houve alternativa possível. Mas salve-se a ilusão desta lápide.
Mário Sacramento em Diário
Sem comentários:
Enviar um comentário