Nunca perderei a mania de, à volta dos
livros de José Saramago, dizer certas parvoeiras – deixem que lhes chame assim.
Aqui vai mais uma: As Pequenas Memórias é um livro fabuloso. Por causa do
inevitável gosto de Saramago pelo cinema, ando a relê-lo. Quantas vezes já o
fiz, como se não houvesse outros, tantos livros, aqui na Biblioteca da Casa?
«Nem tudo foram sustos nas salas de cinema aonde o garoto de calções e cabelo cortado à escovinha podia entrar. Havia também fitas cómicas, em geral curtas, com o Charlot, o Pamplinas, o Bucha e o Estica, mas os actores de quem mais gostava eram o Pat e o Patachon, que hoje parece terem caído em absoluto esquecimento. Ninguém escreve sobre eles e os filmes não aparecem na televisão. Vi-os sobretudo no Cinema Animatógrafo, na Rua do Arco do Bandeira, aonde ia de vez em quando, e recordo quanto me ri numa fita em que eles (estou a vê-los neste momento) faziam de moleiros. Muito mais tarde viria a saber que eram dinamarqueses e que se chamavam, o alto e magro, Cari Schenstrom, o baixo e gordo, Harold Madsen. Com estas características físicas era certo e sabido que chegaria o dia em que teriam de interpretar Dom Quixote e Sancho Pança, respectivamente. Esse dia chegou em 1926, mas eu não vi a fita. De quem eu não gostava mesmo nada era do Harold Lloyd. E continuo a não gostar.
José Saramago As Pequenas Memórias, página 60
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