Há
um terror de mãos na madrugada,
Um rangido de porta, uma suspeita,
Um grito perfurante como espada,
Um olho exorbitado que me espreita.
Há um fragor de fim e derrocada,
Um doente que rasga uma receita,
Uma criança que chora sufocada,
Um juramento que ninguém aceita,
Uma esquina que salta de emboscada,
Um risco negro, um braço que rejeita,
Um resto de comida mastigada,
Uma mulher espancada que se deita.
Nove círculos de inferno neste sonho,
Doze provas mortais para vencer,
Mas nasce o dia, e o dia recomponho:
Tinha de ser, amor, tinha de ser.
José Saramago em Os Poemas Possíveis
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