Aqui, na Terra, a fome continua,
A miséria, o luto,
e outra vez a fome.
Acendemos cigarros
em fogos de napalme
E dizemos amor sem
saber o que seja.
Mas fizemos de ti
a prova da riqueza,
Ou talvez da
pobreza, e da fome outra vez,
E pusemos em ti
nem eu sei que desejo
De mais alto que nós,
e melhor e mais puro.
No jornal soletramos,
de olhos tensos,
Maravilhas de
espaço e de vertigem:
Salgados oceanos
que circundam
Ilhas mortas de
sede, onde não chove.
Mas o mundo,
astronauta, é boa mesa
(E as bombas de
napalme são brinquedos)
Onde come,
brincando, só a fome,
Só a fome,
astronauta, só a fome,
José Saramago em Os Poemas Possíveis
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