Luiz Pacheco teve, um dia,
uma das suas saídas, roçando o genial, aquelas que ficam para a História:
«O Saramago é o grande vencedor do 25 de Novembro».
Numa entrevista concedida a Ernesto Sampaio,
e publicada no Diário de Lisboa de 8 de Março de 1980, José Saramago sintetiza
como é que livro se levantou do chão:
«Se o pai é o 25
de Novembro, a mãe é o acaso. O meu primeiro movimento, isto no que toca a
perspectivas de produção literária, tinha sido transportar-me para as terras
ribatejanas onde nasci, levar a traduçãozinho em estaleiro (por sinal um
volumoso tratado de psicologia) e tentar o livro campestre que eu andava a
sentir necessidade de escrever. Motivos vários impediram a realização do
projecto por aquelas bandas. Além disso, parecia-me errado ir cometer uma
espécie de regresso ao ovo natal. Foi então que me ocorreu o contacto que
estabelecera, em meados de 1975, com a UCP «Boa Esperança», de Lavre, por causa
de uma entrega de livros para a biblioteca que eles andavam a organizar.
Escrevi, perguntei se podia ir, como seria isso de comer e dormir, e se havia
lugar onde trabalhar, um espaço para a máquina de escrever. Eles responderam:
«Venha». E eu fui. Estive em Lavre, da primeira vez, dois meses, depois, por
intervalos, umas tantas semanas mais, e quando de lá voltei trazia cerca de
duas centenas de páginas com notas, casos, histórias, também alguma História,
imagens e imaginações, episódios trágicos e burlescos, ou apenas do quotidiano
banal, acontecimentos diversos, enfim, a safra que é sempre possível recolher
quando nos pomos a perguntar e nos dispomos a ouvir, sobretudo se não há
pressa. Andei por Lavre, Montemor-o-Novo, Escoural, por lugares de gente e
descampados, passei dias inteiros ao ar livre, sozinho ou acompanhado de
amigos, conversei com novos e velhos, sempre na mesma cisma: perguntar e ouvir.»
Levantado Chão: um livro pensado
durante dois anos, escrito em cinco meses, o começo numa escrita normal, «como
toda a gente faz», e depois, «a folhas vinte e quatro ou vinte
e cinco, algo começa a suceder uma das coisas mais
bonitas que me aconteceram» e fica o autor perante a reinvenção da sua
linguagem, a linguagem saramaguiana.
Francisco Vale, hoje editor da Relógio d’Água, ao tempo
(1981) colaborador de O Jornal, fazia o balanço literário de 1981 («Não foi
infecundo o chão das nossas letras no ano que termina»).
- Qual a
importância de Levantado do Chão?
- Responda o futuro
que é obrigação sua. Para mim, autor, tem esta importância toda: falhava-me a
vida se não o tivesse escrito. E, como uma graça nunca vem só, descobri que com
o Lenatando do Chão aprendi, enfim, a escrever, isto é, a amar profundamente as
palavras.»
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