Da minha infância
guardo os fins-de-semana, alguns dias das férias do Carnaval, da Páscoa, do
Natal que passava em casa da minha avó paterna, umas águas- furtadas no nº 16 da
Rua Senhora do Monte, o casario da Graça, uma vista esplendorosa para o Tejo,
cheio de fragatas, de navios a descarregarem cereais a granel, a outra margem
com as altas chaminés do Barreiro, desprendendo fumos.
A minha avó, nos dias
de sol, punha um pano branco para fazer sombra, uma mesinha na varanda das águas-furtadas,
frente a um rio que é um mar.
Ficava ali horas.
Ali, sentia que o
mundo era maravilhoso e assim seria para todo o sempre.
Ali, era o meu lugar
de eleição, uma magia única, um paraíso que não mais voltei a encontrar, qualquer
coisa que toca, enfeitiça.
Algures, Walter
Benjamim diz que para conhecer toda a melancolia de uma cidade, é preciso ter sido
lá criança.
Como António Gedeão,
sempre quis voltar a subir aquelas escadas, bater à porta, dizer a quem a
abrisse, que um miúdo de 8 anos em tempos distantes olhava o Tejo daquela
varanda e se poderia rever essa sensação.
Quando subo aquela
rua, paro à porta, olho o marco do correio que ainda se encontra junto à porta
e, ao contrário de Gedeão, nem as escadas subo.
Dados os tempos de
insegurança, de gatunagem diversa que se vivem, talvez a ideia não fosse assim
tão fácil de concretizar.
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