quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

À ESPERA, SEMPRE À ESPERA


O maior bocado das nossas vidas são perdas.

Eduardo Guerra Carneiro, no começo do ano de 2004, decidiu não viver mais.

Talvez a 2 ou 3 de Janeiro, não importa muito o dia, foi encontrado na laje do prédio onde vivia, ali ao Príncipe Real, mais concretamente, na Travessa do Abarracamento de Peniche.

Um voo filho da puta pôs fim à solidão do Eduardo Guerra Carneiro.

O Baptista-Bastos escreveu que ele atirou-se para o céu.

Ainda há dias o Manuel S. Fonseca escrevia: Eis o que sendo humano me é estranho: o suicídio.

No livrinho Profissão de Fé, a páginas 33, encontram lá este começo de poema que dá nome ao livro:

A dor é isto: um vazio. E sentir
depois um vazio maior – esperar
a morte. Escrevo, assim, convicto,
num estado semelhante ao pó,
mas em lava ardente procuro
a maneira ainda de incendiar.

A morte é isto? Um vazio? Mas
escrevo para contar aos outros
deste sentimento estranho. Ao espelho
vejo ressentimento, usura, uso
e abuso do tempo que me deram.
E ardo na paixão gelada, sem morrer.

Espero por ti, seguro que já sei
nada mais de ti esperar.

Sim, posso pegar nos livros do Eduardo e ler as maravilhas que nos deixou.

Mas é sempre um enorme vazio.

Legenda: o título é um verso do Eduardo em Algumas Palavras

2 comentários:

Luis Eme disse...

Também gosto muito da poesia e das crónicas do Eduardo...

Sammy, o paquete disse...

O Jorge Silva Melo, após a morte do Eduardo, «exigiu» que se fizesse um livro, mesmo um livro desarrumado e incerto, com o que ele deixara, fosse o que fosse. Mas já vão 16 anos e… nada.
Em Abril de 2014, no subterrâneo da & etc, numa conversa com o Vitor Silva Tavares, seu amigo e editor, falei do espólio do Eduardo e ele não me conseguiu adiantar palavras que permitissem acalentar uma leve esperança que viesse a fazer-se qualquer coisa.
Sei de uma antologia, «Mil e Outras Noites» editada pela Língua Morta, em Maio de 2018. Terminado este Tempo de Natal – já não falta muito!... – irei em busca do livrinho. Será o primeiro livro a comprar neste bissexto 2020, e é muito bonito que seja um livro do Eduardo.
Gostava muito do Eduardo Guerra Carneiro,