quinta-feira, 13 de agosto de 2020

FADO COMO NÃO HÁ OUTRO


Corre por este ano, o centenário do nascimento de Amália Rodrigues.

Desde o início deste blogue, que não houve a preocupação de registar datas, sejam elas quais forem.

À medida sabe-se lá bem de quê, vamos falando do que nos apetece falar, de quem nos apetece falar.

Falamos hoje de Amália.

Amália vista por Mário Sacramento no distante e difícil tempo de 1968.

A entrada diarística está datada de 6 de Junho de 1968 e surge a propósito de um Congresso de Radiologia, realizado na Aula Magna da Reitoria de Lisboa:

«Às tantas, mas no salão, cantou a Amália. Se bem que deteste o fado, emocionou-me. Tem nervo, tem arte – é da raça dos eleitos. Transforma em oiro o metal mais vil. Toda de negro, como manda a praxe, mas com um cinturão de oiro, a maior beleza do seu rosto está na tensão que imprime à jugular, quando canta. Nenhum outro excesso. A boca é duma sensualidade incrível – toda a boca e não o lábio inferior apenas. Alguns dentes mais escuros ou deteriorados sublinham a sua verdade. Gaforina de leoa. Simplicidade sem embustes. E muito, muito carvão nos olhos, ora extinto, ora em labaredas. Depois, o reportório, um reportório certo: «Lisboa não sejas francesa»; ou «Mulheres que lavais no rio»… Amália, comoveste-me. Sobretudo quando disseste (graciosamente, fora anunciado já) porque o Sr. Dr. Corte Real me fez radiografias de graça quando eu não tinha dinheiro com que pudesse pagar-lhas…
Até nisso fado. Mas fado como não há outro.»

O que transparece nesta opinião de Mário Sacramento é mesmo uma profunda admiração por Amália, ele que nem sequer gostava de fado.

Há alguns anos atrás, o actor Rogério Paulo divulgou que Amália Rodrigues, em tempo de ditadura, ajudava monetariamente as famílias dos presos políticos. Quando Amália morreu, José Saramago confirmou essa faceta por parte da artista.

Seria essa ajuda do conhecimento de Mário Sacramento?

O pormenor não interessa por aí além.

Em Junho de 1972, numa entrevista a Guilherme de Melo, publicada no «Notícias de Lourenço Marques», Amália disse:

«Já tenho uma idade e já cheguei a uma altura da minha vida como mulher e da minha carreira como artista em que não precisos de me agarrar às «direitas» para subir ou às «esquerdas» para me evidenciar.»

Em Amália, importa realçar a riqueza com que rodeava tudo o que interpretava, a paixão com que envolvia todas as palavras que cantava fossem em português, em francês, em espanhol, em inglês.

Um verdadeiro esplendor, uma diva.

1 comentário:

Seve disse...

Divas - aparecem de século a século!