quinta-feira, 26 de outubro de 2023

FRIA CLARIDADE

No meio da claridade
Daquele tão triste dia
Grande, grande era a cidade
E ninguém me conhecia

Rostos, carros, movimentos 

Traziam noite e segredo
Só eu me sentia lento 

E avançava quase a medo

Só a saudade da pátria 

Longínqua, me acompanhava
Quisera voltar à serra 

E ouvir o vento e a água brava

Quisera voltar ao bosque 

Onde sei que sou lembrado
Voltar às leiras de Afife
E ouvir a canção tão mansa 

Do pastor que guarda o gado

Mas nas ruas sinuosas 

Ainda o rumor crescera
E eu contemplava assombrado
Minhas mãos ontem com rosas

Minhas mãos hoje de cera

Então passaram por mim 

Uns olhos lindos, depois
Julguei sonhar, vendo enfim 

Dois olhos, como há só dois

Em todos os meus sentidos 

Tive presságios de adeus
E os olhos logo perdidos 

Afastaram-se dos meus

Acordei, a claridade 

Fez-se maior e mais fria
Grande, grande era a cidade 

E ninguém me conhecia

Pedro Homem de Mello

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