Morrer em Portugal
Mário Ventura
Capa: José
Cândido
Livraria
Bertrand, Lisboa, Abril de 1975
Começou a nevar de manhã cedo, no momento
em que o ar ficou mais seco, nevou durante todo o dia, e ao cair da noite uma
camada muito branca e pouco segura cobria todo o Norte da Espanha. A neve
tombava ainda quando o escuro e longo comboio, avultando estranhamente no manto
branco, avançou pela noite dentro, com os homens que regressavam ao aseu país.
A meio da madrugada aquele comboio
entrara de obcecar-me. Esperava havia horas, cercado pela neve e pela
indiferença da cidade adormecida. As perguntas que fazia de quando em vez, para
convencer-me a mim próprio de que o tempo passava, encontravam o eco como
resposta. Só o uivo prolongado dos «mercadorias» em marcha me dizia que nem
tudo dormia naquela noite sem fim, noite que reavivava o pesadelo de outras
noites intermináveis.
«Quando llega el emigrante?»
Nem sequer uma palavra, apenas um encolher de ombros. E sobre todas as coisas, pessoas e palavras que não se disseram, um frio penetrante que empurrava para a inconsciência.
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