sábado, 28 de janeiro de 2017

MAIS DO QUE MERO ENTRETENIMENTO LIGEIRO


Andava desesperado a tentar fazer um disco, mas não queria fazer singles, discos de 45 rotações – o género de músicas que passava na rádio. Os cantores folk, os artistas de jazz e os músicos clássicos, faziam LPs, alguns com imensas canções nas espiras – inventavam identidades e criavam desequilíbrios, tinham mais impacto. Os LPs eram como a força da gravidade. Tinham capas à frente e atrás que dava para admirar horas a fio. Comparados com eles, os de 45 rotações eram fininhos e por acabar. Amontoavam-se e parecia que não valiam nada. De qualquer forma eu não tinha uma única canção no meu reportório para a rádio comercial. Canções sobre contrabandistas depravados, mães que afogavam os próprios filhos, Cadillacs, trevas e cadáveres no fundo dos rios não eram para radiófilos, Não havia nada de pacato nas músicas folk que eu cantava. Não eram fáceis nem amadurecidas. Não davam calmamente à costa. Acho que se pode dizer que não eram comerciais. Não era só isso, o meu estilo era demasiado errático e difícil de encaixar na rádio e as canções, para mim, eram mais do que mero entretinimento ligeiro.

Bob Dylan em Crónicas

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