Coração Acordeão
Alexandre O’Neill
Selecção de
Vasco Rosa
Capa: André Carrilho
O Independente,
Lisboa 2004
Teixeira de Pascoaes: um rosto de pedra atormentada,
um olhar de infatigável espião das sombras, um sorriso bom como o fogo das
lareiras…
Teixeira de Pascoaes ou a bondade do que é grande, a
«bondade» do Marão…
«Teixeira de Pascoaes? Pois sim… Pois sim…», diz o
cretino que sempre aparece ao nosso lado, como um anão saltitante, quando a
morte dum grande poeta ou de qualquer outro «’anormal» nos dá, em bloco, todas as razões de o amarmos sem reservar
sentimentos, sem aguardar cautelosamente que tudo seja dito para tomarmos
partido, para assumirmos a atitude «conveniente», o ponto de vista «a ter», o
gosto a exibir…
«Pois sim… Pois sim…» como se fosse meter o poeta do Regresso do Paraíso num encolher de
ombros ou num arroto de despeito… (E eu pensava, com aquele extremo cansaço,
aquela imensa vontade de desistir que nos assalta quando topamos com certos
«especialistas» de poesia: «Talvez não arrotes o mesmo quando chegares à minha
idade…»)
«Pois sim… Pois sim…, como se fosse possível reduzir o
poeta a uma «filosofia», arrumar em quatro palavras Teixeira de Pascoaes, momento da nossa poesia, mastro desse barco
de loucos que é a nossa poesia portuguesa!
«Pois sim… Pois sim…», como se fosse possível à
mediocridade fazer passar os gigantes por moinhos, os grandes poetas por
moinhos de palavras…
Tudo isto – a morte de Pascoaes, o atrevimento dos
ignorantões, a necessidade adulta de conhecer e ajudar a conhecer, das raízes
aos ramos e dos ramos aos pássaros, a árvore da poesia que resiste e cresce
neste chão português – tudo isto precipitou em mim a lembrança do grande poeta,
desse pequeno homem simples, desse velho de fácil convívio e «impertinente»
juventude.
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