Alain Olmax, no
sótão da sua casa na 3rd Street, costumava fazer festas duas vezes por mês e
convidava cantores folk para tocar. Bob Dylan foi a uma dessas festas, uma ou
duas vezes, e foi aí que viu o Mike Seeger tocar sem the Ramblers.
Ele tocou «The Five Mile Chase», Mighty Mississipi»,
«Clude Allen Blues» e mais algumas canções. Ele tocava todos os instrumentos, o
que a canção pedisse – banjo, violino, bandolim, auto-harpa, viola e até
harmónicacom suporte. Mike arrepiava qualquer um. Era intenso, um cara de pau,
irradiava telepatia, usava uma camisa branca como a neve e faixas prateadas nas
mangas. Tocava todos os planos, o catálogo completo dos estilos dos velhos
tempos, todos os géneros e dominava todos os idiomas – Blues do Delta, ragtime, canções
trovadorescas, buck-and-wing, danças em linha, danças de festa, hinos e gospel
– estar ali e vê-lo de perto inspirou-me. Não se limitava a tocar bem, tocava
estas canções tão bem quanto era possível tocá-las. Eu estava tão absorvido a
ouvi-lo que nem estava ciente de mim. Mike já possuía nos genes, na sua
estrutura interna, aquilo que eu precisava ainda de trabalhar. A música estava-lhe
no sangue antes de ter nascido. Não era possível que alguém pudesse, pura e
simplesmente, aprender aquilo, e tornou-se claro para mim que teria de
modificar os meus padrões de pensamento profundo… que tinha de começar a
acreditar em possibilidades que nunca me tinha permitido antes, que encertara a
minha criatividade num universo muito estreito e controlado… que as coisas se
tinham tornado demasiado familiares e que provavelmente teria que me
desorientar a mim mesmo.
Antes do sótão
da casa de Alain Olmax, Bob Dylan vira tocar Mike Seeger, com os The New Lost
City Ramblers, no pavilhão de uma escola na East 1oth Street:
Ele era
extraordinário, até me deu arrepios. Não tinha precedentes. Dava-se ares de
duque e de cavaleiro errante ao mesmo tempo. O arquétipo perfeito dos músicos
folk. Seria capaz de enfiar uma estaca no coração negro do Drácula. Era ao
mesmo tempo romântico, igualitário e revolucionário – tinha cavalheirismo no
sangue. À semelhança de uma figura de uma monarquia restaurada, ele vinha
purificar a igreja.
Bob Dylan em Crónicas
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