Instinto Fatal é um filme que vive da extrema e feroz sexualidade de Sharon Stone,
aquele lento e perverso cruzar/descruzar de pernas de Catherine Tramell, sem
roupa interior, cigarro na mão perante um grupo de polícias de boca aberta e
baba a escorrer, que a queriam interrogar.
É tudo muito
rápido, são breves segundos.
Não se vê nada,
apenas a sugestão e isso é o encanto do cinema: na memória de quem vê cinema,
os momentos mais eróticos nunca são os mais explícitos, dizia o Sr. Freitas
Santos que das duas coisas sabia alguma coisa, mais duma do que de outra.
Com o cabelo
louro apanhado, vestido branco curto, senta-se numa cadeira em frente a uns
polícias que estão naquela sala para a interrogar.
Prepara-se para
acender um cigarro.
Um dos chuis,
diz-lhe:
- Não pode fumar aqui!
Com uma calma
olímpica, pergunta:
- O que vão fazer? Prender-me por fumar?
Acende o cigarro
e fazem-lhe a pergunta:
- Dedica-se a actividades sadomasoquistas?
Com um sorriso,
ela devolve a pergunta:
- Em que é
está a pensar exactamente?
Por alguma razão,
há quem seja de opinião que o cinema foi inventado para filmar as mulheres.
Que seja!
O olhar de
Eduardo Prado Coelho no 2º volume de Tudo o que Não Escrevi:
No cinema, Basic Instinct, com Sharon Stone em
grandeza e plenitude. Curiosamente, é um filme de que quase toda a gente se
sente obrigada a dizer mal, com a preocupação de se demarcar de qualquer
suspeita de poder ter gostado por motivos menos puros. Contudo, trata-se de um
policial interessante e bem executado, e é difícil ficarmos indiferentes à
presença de Sharon Stone. Mas porquê? Por ele ser belíssima e elegantíssima?
Seria insuficiente. Há no filme um suplemento de fascínio, que resulta do
confronto entre a mera inteligência masculina e uma inteligência sexual que
combina o mais feminino dos corpos com a mais masculina capacidade de
raciocínio. A famosa cena do interrogatório não é apenas interessante pelo
facto de Sharon Stone, ao descruzar as pernas num relance o sexo nu. O que se
passas é mais do que isso: é uma debandada (em todos os sentidos do termo) da
inteligência masculino policial face a uma inteligência que se reforça na
afirmação fálica através do modo como desafia os homens quanto à sua vontade de
continuar a fumar. O riso nervoso e perturbado que se difunde entre polícias e
espectadores do filme é apenas o reconhecimento constrangido de que uma
inteligência sexual é sempre mais inteligente do que uma simples inteligência
sem mais nada. O que o filme de Paul Verhoeven tem de provocatório é o
curto-circuito que estabelece entre o primitivo da instância sexual e o mito
computorizado de uma inteligência sem falhas.
Sem comentários:
Enviar um comentário