Essa sede de notícias, bem a compreendo. Mas o pior é
que não as há. A inconsciência em que se vive em Portugal, seria enternecedora
se não fosse trágica. E de tal modo que vista aqui de dentro a situação, apesar
dos gritos de alarme de fora, passam-se os dias, soalheiros ou chuvosos, como
se tivéssemos lido no livro do destino o próspero futuro que a Senhor de Fátima
tem prometido a Portugal. Graças ao terço que todos nós, duma maneira ou
doutra, vamos rezando. Nunca nação nenhuma caminhou para o abismo com tamanha
indiferença. Nem sequer estrebuchamos. É claro que acabaremos por abrir os
olhos, mas isso será já na queda, quando já nada nos puder salvar.
Carta de José
Saramago, datada de 26 de Maio de 1961, para José Rodrigues Miguéis em Correspondência.
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