Carta, sem data,
de Mário-Henrique Leiria para a doce e maravilhosa Jezebel:
Chegou-me a tua carta ontem, tal como o teu desespero
e a tua dúvida. Porquê, querida?
Afinal, sabes tão bem como eu que cada um escolhe o
caminho que quer. Há caminhos que levam à torta de chocolate e outros que levam
ao inferno. Quanto a mim, acho os segundos mais excitantes; pelo menos lá é
quente e há gin.
Escuta, querida.
Não deves estar tão desesperada e tão duvidosa, até
porque sabes perfeitamente que, se deixasses para trás os filhotes e o
companheiro, ias passar a vida com tremendos casos de consciência. E isso era
pior.
Claro que te explico isto com a normal e bruta indiferença
que todo o mundo afrma existir em mim. Mas aí está: ei sou bruto e indiferente,
tu não. A ti tudo te magoa e fere, a mim nada me atinge, como de costume.
Olha.
Gosto tanto de ti que até me parece que fui injusto
quando afirmei que não tinha coragem para abandonar tudo e vir ter comigo.
Coragem tens, e enorme. Só que não podes (não deves) fazê-lo, senão ias destruir-te.
E, afinal, eu não quero a destruição de ninguém. Parece mentira, mas é verdade.
Sem comentários:
Enviar um comentário