domingo, 29 de abril de 2018

DÊEM O PRÉMIO A OUTRO!



A Frenesi Loja tem à venda (30 euros, portes incluídos) uma edição comemorativa dos dez anos do Prémio Fernando Pessoa, profusamente ilustrado a cor, encadernação editorial em tela gravada a ouro na pasta anterior e na lombada, com sobre capa impressa, folhas-de-guarda impressas.

«O grande interesse nesta publicação, que reúne fotos e entrevistas com os galardoados de uma década, reside no facto de testemunhar, num registo verdadeiramente patético, o embaraço dalguns membros do júri mais audazes quando, rumo a Cascais em demanda do nosso maior poeta vivo, Herberto Helder, portadores do “ouro” do Prémio Pessoa 1994, encontraram o caminho de volta na simplicidade inflexível da palavra de um pobre guardador do seu crisol: «Vocês não digam a ninguém e dêem o prémio a outro...»


«Em 1994, foi-lhe atribuído o Prémio Pessoa pela sua obra que, segundo o júri, iluminava a língua portuguesa.

Uma pipa de massa para quem tinha uma reforma curta.

Mas Herberto Helder recusou a distinção.

António Alçada Baptista e Clara Ferreira Alves, em nome próprio e do Expresso, tentaram demovê-lo.

Conta o Alçada Baptista:

O Herberto estava na sala. Falou à Clara e depois a mim.

Eu disse, meio a brincar meio a sério:

 - Vimos numa difícil missão...

Ele, com toda a simplicidade dele, disse-me logo que não, calculando que era um prémio.

Não foi possível demovê-lo e sentimos que aquilo era tão fundo e tão importante para ele que não devíamos insistir. Ele disse:

- Vocês não digam a ninguém e dêem o prémio a outro...

- Não pode ser, o júri escolheu-te a ti, a decisão está tomada; respeitamos que digas que não...

Ele ainda acrescentou:

- Peço que sejam meus mandatários e digam ao júri que eu agradeço mas não posso aceitar.

Eu queria transmitir bem que não havia aqui nenhuma arrogância: a sua recusa não era contra ninguém. Era uma decisão do seu eu mais íntimo, que logo nos mereceu o maior respeito.

Eu só lhe disse:

- Eu já gostava de ti e vi agora que é possível ainda gostar mais.»

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