Comércio com o Inimigo
José Rodrigues
Miguéis
Capa: Armando
Alves
Colecção Duas
Horas de Leitura nº 21
Editorial Inova,
Porto, Julho de 1973
Fico de novo só entre as vozes electónico-angélicas,
em plena multidão dos vivos, eu, que sonhei ressuscitar os mortos (ou
ressuscitar-me dentre eles). Recomeçar a cada instante, ou periodicamente, a
vida nova: não é essa a mensagem do Santo Solstício? Por isso o festejamos. A
vida que perpetuamente renasce das cinzas que somos, o Cristo dentre os mortos,
o eterno devir, a esperança ou certeza do dia, quando a noite nos afoga. Mas
hoje não, é tarde. Agora é tarde. Há quantos anos eu aturo isto! Tudo a
recomeçar, noutro plano e talvez noutra vida, noutro mundo. Eu passo e eles
ficam. (Como elas!) Deixá-los ficar. O meu Natal é outro, é outra a minha Cruz.
Vou sempre em sentido contrário, incoincidente.
Desço a Quinta Avenida, a gente vai rareando, a luz e
o amor decrescem, como as decorações. Até que mergulho de novo nos bairros
obscuros, calados e desertos.
Afinal não me ocorreu a ideia! Paciência, talvez para
o ano que vem.
Ainda não é hoje que escrevo, o Conto Alegre de Natal.
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