Eu não tenho
computador, não tenho telemóvel, não tenho cartão de crédito, não tenho carro,
resumindo: sou todo meu. Estou aqui sentado nesta cadeira a escrever esta
crónica, cheio de vontade de voltar para o livro que ainda não parou de me
trazer problemas. Do ponto de vista técnico é muito difícil, o material não
cessa de crescer, estou mais ou menos a meio da primeira versão o que significa
que, trabalhando as minhas doze horas diárias habituais, talvez a acabe lá para
o fim do ano se nada especial acontecer na minha vida que me impeça de
rabiscar. Não sei porque me meti neste livro, quer dizer sei mais ou menos: foi
ele que se meteu em mim. Tinha acabado o livro anterior, estava à espera,
vazio, e apareceu este primeiro depressa, depois devagar, depois depressa outra
vez quando os vários elementos principiaram a juntar-se, depois devagar de novo
à medida que ia crescendo. Tem vinte e cinco capítulos, acabei a primeira
versão do décimo segundo hoje, queria começar a ocupar-me do décimo terceiro
mas tenho de fazer estes textinhos para a revista.
António Lobo Antunes de uma crónica na Visão,
20 de Julho
Legenda: imagem da Sábado.
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