sábado, 21 de outubro de 2017

PEÇO-LHE A MAIOR PRUDÊNCIA QUANDO ME ESCREVER


Carta de Paris, s/d, escrita de Paris, para Jorge de Sena.
Em Março de 1962 Sophia, juntamente com outros escritores portugueses, Alexandre O’ Neill, Agustina Bessa Luís, Urbano Tavares Rodrigues, Natália Correia, José Cardoso Pires, António Pedro, Ilse Losa, esteve em Florença a assistir ao Congresso da COMES (Comunidade Europeia de Escritores).
Sophia diz a Sena que pensava ir assistir a um congresso literário mas foi mais político que literário.

O Congresso ara anti-fascista – coisa com que concordo mas os métodos usados foram fascistas, mal educados e policiais. Que haverá por trás disto tudo..Todo o ambiente do Congresso foi de nervosismo e de desconfiança e eu sem o Francisco ao meu lado e sem mesmo ter combinado com ele qual a linha a seguir senti-me verdadeiramente só num mundo de intrigas que não é o meu. Muita falta me fez ali a sua presença.
Criaram à volta da Agustina um clima de suspeita e inquisição. E isso foi-me dito por uma pessoa direita e de carácter: Disseram-me que eu a devia abandonar pois o facto de eu andar com ela me comprometia. Como você sabe eu não sou capaz de abandonar nenhuma pessoa que está só e que é injustamente acusada e perseguida na sua liberdade.
(…)
Estive com o Murillo Mendes com quem conversei mas não tão longamente como seria necessário, ele nervosíssimo, eu exausta. E sendo as minhas ideias sobre política tão próximas das do Murillo creio que el não entendeu porque razão eu acompanhei humanamente a Agustina. Aliás o clima que se respira na Europa é de violência, desequilíbrio, paixão, falta de serenidade. Penso que vão acontecer as coisas mais graves mas esta atmosfera de desconfiança é já de si gravíssima. Nada está esclarecido e o esclarecimento parece impossível. Faltou-me gravemente não ter aqui o Francisco. A nossa vida é cada vez mais engagée na luta que você sabe mas a oposição está cheia de aventureiros que sujam e confundem tudo. Está também cheia de tontos.
Há muito que não recebo notícias suas. Passaram por Lisboa uns brasileiros que vinham da sua parte mas não tiveram tempo para falar connosco.
Peço-lhe a maior prudência quando me escrever.


Legenda: imagem obtida em PretoBranco

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