domingo, 28 de abril de 2019

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Foi numa crítica de televisão do Mário Castrim, no Diário de Lisboa, que li a frase do José Gomes Ferreira que vem em A Memória das Palavras, Ou o Gosto de Falar de Mim: «saudades, só do futuro.»

Como eu gostei do raio da frase, o próprio título do livro era apelativo.

Na biblioteca do meu pai não havia nenhum livro do José Gomes Ferreira.

Corria o ano de 1966, era Junho, um salto até à Feira do Livro para beneficiar do desconto: Na livraria 45$00, na Feira 36$00, e os preços ainda estão a lápis na primeira folha do livro.

Há livros de encantar. Este é um deles.

Não há ninguém tão feliz como o leitor que de súbito se descobre inteligente. A descoberta de José Gomes Ferreira, o comprar de A Memória das Palavras na Feira do Livro, é um destes casos, o saber certo de que vamos ficar com um autor para a vida.

No livro lia-se: «a maioria dos meus versos componho-os às topadas por essas ruas. Ai de mim, quando envelhecer!»

Se ele era poeta, havia que ir à procura dos livros.

E fui.

Uma Sessãopor Cinema é um livro publicado pela Cinemateca para assinalar o centenário do nascimento de José Gomes Ferreira que nasceu no Porto no dia 9 de Junho de 1900.

É uma antologia de textos de José Gomes Ferreira sobre cinema publicados nas revistas da época: a Kino, a Imagem, a Girasol, a Ilustração.

Para além desses textos e críticas, José Gomes Ferreira colaborou com os amigos Cottinelli Telmo e Chianca de Garcia nos filmes em A Canção de Lisboa e A Aldeia da Roupa Branca.

Mas com o pseudónimo de Álvaro Gomes fez a tradução e legendagem de filmes.

Durante cerca de cinco décadas, essa foi a sua principal actividade profissional.

De modo que, quando no cinema lia Legendas de Álvaro Gomes desconhecia que era o poeta José Gomes Ferreira que estava por detrás daquele pseudónimo.

No seu livro Revolução Necessária, Gomes Ferreira fala desse trabalho:

«De redactor de revistas cinematográficas (com inúmeras máscaras de pseudónimos e crítico do Diário de Lisboa), a tradutor de fitas assinadas pelo sr. Álavro Gomes pouco tempo levou. E, a certa altura, dei comigo na escravatura de arrastar, pela vida fora, grilões de chatice de sebo e raiva. Claro que as traduções de quilómetros de películas más fixaram para sempre o meu ódio ao cinema que eu chegara um dia a amar episodicamente na Noruega, quando assisti à exibição de um filme extraordinário com o título de A Revolta do mar Negro.
Revi-o há pouco em Lisboa com o seu nome verdadeiro: O Couraçado Potemkine.

A rotina de um trabalho penoso - seria bem pago? - levou-o a afastar-se do cinema, a quase odiá-lo.

O Sr. Álvaro Gomes era o poeta José Gomes Ferreira.

Como o poeta escreveu:

Viver sempre também cansa.

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