A págs. 80 de Rota de Vida de Joaquim Vieira é-nos revelado um poema, sem título, de José
Saramago, datado de 1944, e que pertence ao acervo da Fundação José Saramago.
Este, e outros
poemas inéditos, são referidos em José Saramago. A Consistência dos Sonhos –Cronobiografia.
Vamos
reproduzi-lo:
«O homem diz que sabe o caminho
Mas não acrediteis porque o homem não sabe o caminho.
E o que o homem disse
E o que o homem diz
E o que o homem dirá
Nada tem de comum com o que o homem disse e diz e dirá
E o homem teima que sabe o caminho
Mas o pobre do homem não sabe, não sabe o caminho
E o que o homem disse
E o que o homem diz
E o que o homem dirá
Nada tem de comum com o que o homem disse e diz e dirá
E há sessenta séculos que o homem diz: Eu sei o
caminho
Mas nós sabemos que o homem não sabe o caminho
E o que o homem disse
E o que o homem diz
E o que o homem dirá
Nada tem de comum com o que o homem disse e diz e dirá
E outros sessenta séculos ouviremos o homem dizer: Eu
sei o caminho
Mas o pobre do homem não soube, não sabe, nem saberá
jamais o caminho
E o que o homem disse e diz e dirá
Nada tem de comum com o que o homem disse
Com o que o homem diz
Com o que o homem dirá.»
Dirá José
Saramago a João Céu e Silva em Uma Longa Viagem com Saramago:
«Não sei o que poderá acontecer amanhã mas não me vejo
a voltar a escrever poesia. A minha poesia é uma poesia de segunda ou terceira
calasse, não vale a pena teimar. Não tive ilusões, é o que é, limpa, honesta e
em algum momento terá sido algo mais do que isso mas, enfim, não vou ficar na
História como poeta. Suponho que se ficar na história será como um romancista
que também fez alguns versos.»
Sobre esta afirmação,
João Céu e Silva acrescenta uma nota de rodapé:
«Já em 1984, José saramago tinha consciência do valor
da sua veia poética e afirma em entrevista a Pedro Correia (O Tempo, 7/12/1984)
que «Não acho, realmente, que seja um bom poeta. E talvez tenha sido a
consciência desse facto que me fez, a partir de certa altura, abandonar de
facto a poesia. Ou melhor: talvez não tenha abandonado inteiramente a poesia. O
que abandonei foi a actividade de fazer versos. E não penso voltar. Pela maior
liberdade que a prosa me concede, pela maior possibilidade de prolongar o
próprio discurso, talvez haja muito mais poesia num romance meu do que toda
aquela que eu seria capaz de inserir num livros de poemas.
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