20 de Abril de 1974
Agarrado a um recorte de jornal, um guardanapo de papel com versos de José
Gomes Ferreira: «Esperança: o teu nome verdadeiro é teimosia de querer ouvir
as pedras a cantar.»
Nas paredes da cidade começam a aparecer inscrições: “O 1º DE MAIO É
VERMELHO!”
Na nota da DGS, publicada nos jornais, cuja reprodução, muito má, acima se
publica, pode ler-se:
«A Direcção-Geral de Segurança fez divulgar, através da Secretaria de Estado de
Informação e Turismo”, a seguinte nota:
“Desde o início do corrente mês, mas com maior intensidade nos últimos dias,
tem-se verificado por parte de várias organizações comunistas, uma grande
actividade na difusão de panfletos e outras actuações de propaganda através das
quais se incita a acções revolucionárias no 1º de Maio.
Com base nas averiguações feitas, foram detidos em Lisboa 15 indivíduos e 15 no
Porto, especialmente aos sectores de “informação e divulgação” daquelas
organizações, alguns dos quais estão de há muito referenciados como seus
orientadores activos.
As averiguações conduziram a
apurar que era nas oficinas do semanário «Notícias da Amadora que se imprimia
muito do material subversivo, tendo nelas sido apreendidos largos milhares de
exemplares de panfletos revolucionários.»
1.
Na 1ª página do Diário de Notícias, com a respectiva fotografia, lia-se que
o «venerável chefe de estado Almirante Américo Thomaz» visitara uma
feira de antiguidades na FIL.
2.
Numa breve notícia O Século informava que três jovens, dois canadianos e
um argentino, foram detidos sob a acusação de prática de imoralidade.
Foram presos por, segundo o agente da PSP, estarem descalços e de tronco nu
deitados na relva. No relatório enviado ao Comando da corporação, o agente informa
que aqueles cidadãos estrangeiros estavam a ofender a moral pública.
3.
Termina, no plenário do Porto, o julgamento de Joaquim Carreira. O réu vem acusado de ter incitado os pr, Antes de Ti, no sentes numa reunião plenária da CDE 2ª uma acção violenta, depois de ter proferido expressões depreciativas da actividade do Governo”. Foi condenado a 135 dias de prisão, 135 dias de multa a 20 escudos e na suspensão dos direitos políticos por três anos, além das custas e do imposto de justiça
4.
Neste dia, conta Otelo Saraiva de Carvalho no seu livro Alvorada em
Abril, que Vítor Alves lhe perguntou qual era a percentagem de
probabilidades de êxito que ele atribuía ao movimento.
Otelo respondeu:
«Não entrando em linha de conta com os imponderáveis, garanto uma
probabilidade de êxito de oitenta por cento para uma vitória concretizada em
doze horas a partir da Hora H.
Vítor Alves olhou-o “estupefacto” e comentou:
Booolas! Se me tivesses respondido com vinte por cento de probabilidades de
êxito, eu tinha achado sensacional! Invertendo os valores e garantindo oitenta,
não estarás, como de costume, a ser demasiado optimista?»
5.
Este EP de António Macedo foi
outro dos muitos discos que nos acompanharam nos dias e nas noites para que a esperança não
caísse ao chão.
No Lado 1 ouvem-se Retalhos
de Uma Noite, Antes de Ti, no Lado2 Erguer a Voz e Cantar, Sei
de Uma Menina.
Todos os poemas e todas as
músicas, com excepção Retalhos de Uma Noite cuja música é da autoria de
Maurício Cunha
Erguer a Voz e Cantar transformou-se em hino antes e depois de Abril:
Canta canta amigo canta
vem cantar a nossa canção
tu sozinho não és nada
juntos temos o mundo na mão
Dizíamo-nos filhos da madrugada
e sabíamos que não podíamos amar serenamente porque muitos dos nossos amigos
estavam na prisão, tentávamos o possível e esse possível era sempre tão escasso
que, por vezes, o desânimo invadia os dias e as noites. Depois alguém
começava: canta amigo canta, vem cantar a nossa canção, tu sozinho não
és nada, juntos temos o mundo na mão, um outro, com um entusiasmo
sereno, lembrava que há coisas que não têm fim, a esperança num melhor, por
exemplo, e a luta por conseguir esse mundo.
Acreditar que num qualquer tempo, um microfone falaria às 4 e tal…
Não falou às 4 e tal, falou antes, mas era o sinal para a madrugada por que tantos esperaram.
Sem comentários:
Enviar um comentário