quarta-feira, 15 de novembro de 2023

OLHAR AS CAPAS


Emílio

Jean-Jacques Rousseau

Selecção, Notas, Tradução, Prefácio: António Sérgio

Colecção Cadernos Culturais «Inquérito» - Série D – nº 41

Editorial Inquérito, Lisboa s/d

Pensa-se tão –só em conservar a criança; mas isso não basta: ensinemo-la a conservar-se mantendo-se um homem, a suportar os golpes da má fortuna, a fazer o rosto à opulência e à miséria; a viver, quando cumpra. Nos gelos da Islândia ou nas ardências de Malta. Por cautelas que tomeis para que ela não morra, não podeis evita que de facto pereça; e ainda quando a morte não fosse, aí, o resultado dos cuidados que vós tomastes, não deixariam eles de ser mal-entendidos. Trata-se menos de lhe impedir a morte que de fazê-la realmente viver. Viver não é respirar: é actuar, é fazer usos dos órgãos, dos sentidos, das faculdades, de todas as partes de nós próprios, que nos dão sentido, que nos dão o sentimento da nossa existência. O homem que mais viveu não é o que contou o maior número de dias, senão que o indivíduo que mais sentiu a vida. Tal há que se enterrou com cem anos e que se diria que faleceu ao vir ao mundo. Melhor fora que houvesse ido ao túmulo na juventude, se ao menos não tivesse vivido até esse tempo.

 

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