Em Chinatown Com a Rosa
Jorge Listopad
Capa: Rogério Petinga sobre pormenor de gravura de Bruno
Bruni
(Rosa
Luxemburgo no Congresso Socialista de 1907)
Gótica, Lisboa 2001
É sabido que
Robinson Crusoé fez de Sexta-Feira sua mulher. Estava sozinho na ilha. Deus
há-de perdoar-lhe.
E por fim, quando
regressou à Inglaterra, do seu exílio forçado, quis manter o hábito. Ouviu
então falar de um bar especializado. Foi lá mas não gostou, sobretudo do facto
de jovens mancebos se adaptarem por alguns pence, aos desejos dos fregueses.
Acabou de tomar o gim, deixou meia libra e saiu para a noite.
Decidiu, pois,
dedicar-se ao estudo. Mas de quê? Das correntes de água? Durante largos anos a
água tinha sido o seu elemento, mas preferia o conhaque. Da heráldica? Essa estudam-na
os jovens lordes de Oxford e os snobs de Cambridge: era assunto que lhes dizia
respeito. Da medicina? Primeiro tinha de aprender latim.
Chegou ao sítio
onde as carruagens paravam. Em Hammersmith Road, onde os debochados alugavam
coches pretos com junta preta e xabraque preto, para o passearem na Londres
nocturna; dentro já estavam à espera prostitutas de véu preto, vestido preto, a
manta preta, e por baixo delas as meias pretas, o corpo branco.
Antes de entrar num
deste veículos de aluguer, parado ainda no estribo olhou para o mundo à sua
volta: o ar estava perfumado. Tirou o chapéu e entrou. Ela olhava-o com os
olhos imensos, até no escuro tinha olhos grandes, olhos atentos, maléficos.
Terminado o passeio
de uma hora bateu na janelinha. Sem virar a cabeça, o cocheiro parou e Robinson
saiu devagar, pagou o que estava combinado, deu alguns passos mas ainda voltou
atrás: tinha-se esquecido da gorjeta. Depois, calmamente, a passo largo entrou
no escuro.
Londres dormia no
silêncio nocturno. Nem vivalma.
No coche foi
encontrada a primeira e, com certeza, não a última vítima de Jack o Estripador,
que não era outro senão Robinson Crusoé, pois em Inglaterra perdera o sentido à
vida e sentia enorme saudade de uma outra ilha aonde já não podia voltar.
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