14 de Maio de 1992
No cinema, Basic Instinct, com
Sharon Stone em grandeza e plenitude. Curiosamente, é um filme de que quase
toda a gente se sente obrigada a dizer mal, com a preocupação de se demarcar de
qualquer suspeita de poder ter gostado por motivos menos puros. Contudo,
trata-se de um policial interessante e bem executado, e é difícil ficarmos
indiferentes à presença de Sharon Stone. Mas porquê? Por ela ser belíssima e
elegantíssima? Seria insuficiente. Há no filme um suplemento de fascínio, que
resulta do confronto entre a mera inteligência masculina e uma inteligência
sexual que combina o mais feminino dos corpos com a mais masculina capacidade
de raciocínio. A famosa cena do interrogatório não é apenas interessante pelo
facto de Sharon Stone, ao descruzar as pernas num relance o sexo nu. O que se
passa é mais do que isso: é uma debandada (em todos os sentidos do termo) da
inteligência masculino policial face a uma inteligência que se reforça na
afirmação fálica através do modo como desafia os homens quanto à sua vontade de
continuar a fumar. O riso nervoso e perturbado que se difunde entre polícias e
espectadores do filme é apenas o reconhecimento constrangido de que uma
inteligência sexual é sempre mais inteligente do que uma simples inteligência
sem mais nada. O que o filme de Paul Verhoeven tem de provocatório é o
curto-circuito que estabelece entre o primitivo da instância sexual e o mito
computorizado de uma inteligência sem falhas.
Eduardo Prado Coelho em Tudo O Que Não Escrevi, Volume II
Sem comentários:
Enviar um comentário