O
Caçador de Elefantes Invisíveis
Mia Couto
Capa: Rui Garrido
Ilustração da capa: Susa Monteiro
Editorial Caminho, Lisboa, Outubro de 2021
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O nosso maior receio é termos herdado a violência dele.
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Engano vosso, meus filhos – declarou a mãe.
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O vosso pai nunca ergueu um dedo contra mim.
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Como pode protegê-lo depois de tantos anos?
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Alguma vez viram uma nódoa negra no meu corpo?
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Então de quem eram os gritos? – perguntou o meu irmão. – De quem era o choro?
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Eu gritava e chorava – respondeu a mãe – porque o vosso pai se agredia a si
mesmo.
O
facto de a raiva do vosso pai se dirigir exclusivamente contra ele mesmo era um
prova de amor tão verdadeiro que, em prantos e soluços, a mãe implorava que o
homem, nesses acessos de raiva. A agredisse a aela.
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O vosso pai só me tocou para me amar.
E
o seu verdaeiro vício não era o álcool. O seu verdadeiro vício éramos nós, a
sua família, que ele amava e que não sabia o que fazer com esse amor. O nosso
pai nunca aprendera a exercer a ternura que havia nele. Tinha medo de se
entregar e de não regressar. A bebida afastava-o dessa carência.
Colaboração de Aida Santos
1 comentário:
MIA COUTO - belíssimo escritor!
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