Dito
já que começaram as iniciativas que visam
registar o centenário do nascimento de José Saramago, acrescenta-se que irei
pegando num qualquer livro de José Saramago e copiarei dele uma frase, um
parágrafo, aquilo que constitui os milhares de sublinhados que, ao longo
dos muitos anos de leituras, invadiram os livros de José Saramago que habitam
a Biblioteca da Casa.
De
seu nome A Bagagem do Viajante, este é o segundo livro de crónicas de José
Saramago.
O
Manual do Viajante será mais uma das
muitas invenções a que Saramago se dedicará para abrir os seus livros, para
colocar nas contra capas.
Diz
o autor a abrir o livro, e que viajante ele é?, que bagagem transporta?
…
«é muito raro poder dizer-se que uma viagem é perfeita antes de acabar. Mas
acontece.»
Se
perceberá nos tempos futuros o que este mesmo viajante nos mostrará nesse
belíssimo Viagem a Portugal.
«O
mito do paraíso perdido é o da infância – não há outro. O mais são realidades a
conquistar, sonhadas no presente, guardadas no futuro inalcançável. E sem elas
não sei o que faríamos hoje. Eu não o sei.»
«Sempre
foram caladas as minhas alegrias.»
(Página
21)
«Por
causa de tudo isto me veio uma grande vontade de chorar. Ninguém me via, e eu
via o mundo todo. Foi então que jurei a mim mesmo não morrer nunca.»
(Página
24)
«Desabafe,
leitor, diga o que pensa desta comédia de enganos que vai sendo a nossa vida.»
(Página
55)
«Se não escrevi o livro definitivo que
tornará a literatura portuguesa, enfim, uma coisa a sério, foi só porque ainda
não tive tempo. Isto é o que me diz o meu amigo Ricardo, e di-lo com tal
convicção, que muito céptico seria eu se não acreditasse sob palavra. (…) Digo
“sim senhor”, se a intimidade não dá para mais, e se é o caso de dar, como
acontece com o meu amigo Ricardo, acho-me tão eloquente que construo uma frase
de oito palavras ‘então vê lá isso cá fico à espera. (…)
Na história que eu escreveria, havia uma aldeia.Logo na primeira página, sai o
menino pelos fundos do quintal, e, de árvore em árvore, como um pintassilgo
desce o rio e depois por ele baixo, naquela vagarosa brincadeira que o tempo
alto, largo e profundo da infância a todos nós permitiu… Em certa altura,
chegou ao limite das terras até onde se aventura sozinho. Dali para diante,
começava o planeta Marte, efeito literário de que ele não tem
responsabilidades, mas com que a liberdade do autor acha poder hoje aconchegar
a frase. Dali para diante, para o nosso menino, será só uma pergunta sem literatura
“vou ou não vou?”. E foi.
Não haverá grandes possibilidades de nos salvarmos, se não salvarmos a
inteligência. Até ao dia em que já não farão falta os intelectuais, porque
todos o serão.»
(Página 62)
« Quero eu dizer
na minha que estas crónicas são também os dizeres de um fala-só. De modo que
fala-sós somos todos: os loucos, que começaram, os poetas, por gosto e
imitação, e os outros, todos os outros, por causa desta comum solidão que
nenhuma palavra é capaz de remediar e que tantas vezes agrava.»
(Página 85)
«Não
haverá grandes possibilidades de nos salvarmos, se não salvarmos a
inteligência. Até ao dia em que já não farão falta os intelectuais, porque
todos o serão.»
(Página 112)
Dirá José
Saramago, já muito andado no tempo, que o melhor que os leitores podem
encontrar, estará nas suas crónicas.
Alguém fez
publicar na badana deste livro de bagagens e viajantes:
«Irei agora pô-lo (o livro «Deste Mundo e do Outro») naquele pedaço de estante onde vivem os livros que tenho de ver todos os dias, de tocar e folhear todos os dias e de ler nem que seja apenas um parágrafo.»
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