terça-feira, 21 de maio de 2013

OLHAR AS CAPAS


Cartas de Estalinegrado

Prefácio de Mário Sacramento
Tradução de Helena Rosado
Editora Arcádia. Lisboa Junho de 1960.

Tenho o teu retrato junto de mim e olhei-o longamente. Revivo aquela noite de Verão do último ano de paz em que atravessámos o vale cheio de flores. Quando nos encontrámos pela primeira vez, falou em nós a voz do coração, depois a voz do amor e depois a da felicidade. Falámos de nós e do futuro que aparecia como um tapete de cores alegres.
Esse tapete de cores alegres já não existe. A noite de Verão também já não existe e o vale cheio de flores também não. E já não estamos juntos. Em vez desse tapete multicor vejo um campo branco sem fim; foi-se o Verão, ficou o Inverno, e já não há futuro pelo menos para mim, e por isso para ti, talvez também não o haja.
Há muito tempo que tenho uma sensação inexplicável – compreendi-a hoje – é medo do que te pode acontecer. A milhares de quilómetros de distância sinto que estás como eu.
Quando receberes esta carta, lê-a, esquecendo-te de tudo o mais – talvez assim oiças a minha voz. Dizem-nos que a nossa luta é pela Alemanha mas há aqui poucos que acreditam que este sacrifício absurdo seja útil à nossa pátria.

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