Nas suas Memórias, Rómulo de Carvalho, também
conhecido como o poeta António Gedeão, conta aos filhos dos netos dos meus
netos o que foi o Movimento do 28 de Maio de 1926:
Em
1926 sucedeu o que tinha de suceder, mais ano menos ano, para pôr cobro ao
desassossego em que se vivia: a instauração de uma ditadura. Tinha este vosso
tetraavô então a bonita soma de vinte anos. A ditadura prolongou-se até 1974, o
que significa que esteve instalada em Portugal durante 48 anos! Foi demais para
a nossa inquietude mas justifica-se tão dilatado tempo por duas fortíssimas
razões que, conjugadas, permitiram esse resultado: uma, foi a simultaneidade de
outras ditaduras em países europeus; outra, foi o surgimento inesperado de um
homem monolítico, nem de torcer nem de quebrara, possuído de uma filosofia
política firmemente assente nos valores tradicionais da Nação (Deus, Pátria e
Família), provinciano de quatro costados, homem sem mulher, que usava botas com
atacadores. Sobre a pressão dessas botas
pôs o país em silêncio enquanto as cabecinhas dos portugueses assomando
na periferia das gáspeas erguiam os olhos para o seu salvador.
Chamava-se,
o homem, António de Oliveira Salazar. Era natural do Vimieiro, no concelho de
Santa Comba dão, e mestre de Economia e Finanças na Universidade de Coimbra.
Notem,
meus queridos tetranetos, que Salazar não se esgueirou por entre as massas para
alcançar a ribalta política. Ele estava sentado na sua cátedra, a debitar os
seus saberes, quando os ditadores militares de 1926, já desorientados com a sua
própria revolução, lhe suplicaram que viesses até Lisboa tornar conta da pasta
das Finanças, pois tinham notícia da sua competência e a nau portuguesa estava
prestes a afundar-se. O homem veio, aceitou o cargo e apresentou o seu plano de
acção governativa. As exigências do seu programa eram muitas e pesadas e, como
não foram aceites, Salazar pôs o chapéu na cabeça e voltou para Coimbra. Cerca
de dois anos mais tarde, como a confusão continuasse na mesma, tornaram a
chamá-lo. Que viesses, que fizesse o que quisesse. Ele veio e vez o que quis,
com a consciência tranquila.
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