Não se pode menosprezar o papel que a poesia de Manuel Alegre representou na luta contra a ditadura.
Não posso esquecer as noites de instrução nocturrna,
no Regimento de Infantaria 5, nas Caldas da Raínha, em que os poemas da Praça
da Canção, o meu velhinho exemplar da Ulisseia, eram lidos por
um alferes que, conjuntamente com outros que tinham recusado continuar carreira
militar na Academia, foram mobilizados e acabaram por fugir, uns para Estocolmo, outros para Paris.
Uma poesia que ajudou a rasgar caminhos, a abrir
janelas.
Mas há a faceta Manuel Alegre pós- 25 de Abril,
dirigente e deputado do Partido Socialista.
O caso muda de figura.
De
alegre se fez triste.
Há dias, num entrevista ao I declarou:
Temos
o privilégio de ter a esquerda mais forte da Europa, mas a esquerda em Portugal
não serve para nada.
Manuel Alegre foi comunista, esteve na guerra
colonial, exilou-se em Argel, onde manteve laços de amizade com Fernando
Piteira Santos.
Ainda em Argel, Manuel Alegre afastou-se do Partido,
Fernando Piteira Santos, alvo de falsas calúnias, acabou por ser expulso
.
Álvaro Cunhal reconhecerá, mais tarde, que dos muitos
erros cometidos pelo Partido, Fernando Piteira Santos foi um desses erros.
Alegre e Piteira Santos regressam, no mesmo dia, ao
Portugal de Abril
.
Alegre filia-se no Partido Socialista, Fernando
Piteira Santos, até à sua morte, manteve-se sempre fora de qualquer partido,
mas nunca da militância política.
.
A
sua coerência com a ideologia marxista que sempre orientou impossibilitou-o de aceitar
qualquer cargo que o afastasse do marxismo que o norteou desde jovem. Cabe aqui
contar um episódio que revela a integridade e coerência política do Fernando.
Alguém perguntou-lhe um dia: “por que é que não te filias no Partido Socialista?”
Resposta: “Porque sou socialista!”. (1)
Mário Soares, o animal político, como gosta que lhe
chamem, nunca foi socialista.
Os seus princípios são os da social-democracia e a
invocação do socialismo foi, apenas, uma história para juntar pedras para o
passeio da sua caminhada política
.
Na primeira oportunidade, Outubro de 1974, Soares
mandou às urtigas as ideias e arrumou – para sempre! – o marxismo bem no fundo
da gaveta.
José Saramago em Outubro de 1996:
Os
partidos chamados socialistas deixaram de ser esquerda. É melhor assumir essa
realidade. Não vale a pena continuar com uma ficção que é a de julgar que os
partidos socialistas ainda são esquerda. Já não são esquerda, são centro. É o
centro de que o tempo em que vivemos hoje necessita.
No decorrer dos tempos, a social-democracia acabará
por ser devorada pelo neo-liberalismo.
Bem o sabemos!
É em todo este deslizar de palavras, que se chega ao
ponto de, face ao momento trágico que o país vive, sabermos, que o Partido
Socialista, quer a todo o custo eleições, apela a uma maioria absoluta, difícil
de obter, mas, mais uma vez, já fizeram saber que deve dar-se absoluta
prioridade ao CDS para uma coligação. Francisco Assis declarou-o em Fevereiro: é
mais fácil uma aliança com a direita.
É nesta certeza que Paulo Portas, coligado ainda com
o PSD, já anda a tratar da sua sobrevivência.
A
esquerda em Portugal não serve para nada.
Pano para muitas mangas.
A política de esquerda terá que ser uma acção
constante de cidadãos, de partidos de esquerda e não uma intrincada partida de
xadrez, de movida por privilegiados de casta, casa e sangue.
A direita nunca defendeu causas, apenas interesses.
Dizem que é
estúpida mas o que é facto é que tem sabido tirar partido da divisão – por que
não cegueira? - da esquerda.
As esquerdas, sim esquerdas, têm
sido impotentes para mudar o poder e colocá-lo ao serviço do povo.
Não há democracia sem cultura.
Mas em tempo de eleições, voltarão os políticos do
arco governamental, contar a velha milonga de que o povo português sabe
escolher.
Apenas dizer:
Perdoai-lhes, Senhor, que eles não sabem onde votam.
Hélas!
(1) Depoimento
de Maria Branco em Fernando Piteira Santos Português, Cidadão do Século
XX, Campo das Letras, Porto Maio de 2003.
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