sexta-feira, 6 de outubro de 2017

COM INDIFERENÇA E RELUTÂNCIA CRESCENTES


6 de Outubro de 1935

Que algumas das últimas poesias sejam convincentes não rouba importância ao facto de que as componho com indiferença e relutância crescentes. Nem sequer conta muito que, por vezes, a alegria de criar seja em mim excessivamente aguda. As duas coisas, colocadas juntas, explicam-se pela desenvoltura métrica que adquiri e que me tira o gosto de escavar a partir de um material informe, e, ao mesmo tempo, pelos meus interesses no domínio da vida prática, que acrescentam uma exaltação passional à meditação sobre certos poemas.
Pelo contrário, o que importa é que o esforço me parece cada vez mais inútil e indigno; e mais fecunda do que a insistência na mesma tecla parece-me ser a busca, há muito desejada, de novas coisas para dizer e, portanto, de novas formas a inventar. Porque, em poesia, a tensão resulta, principalmente, da fome de realidades espirituais ignoradas, mas pressentidas como possíveis. Uma última defesa contra o desejo de tentativas violentamente renovadoras encontro-a na orgulhosa convicção de que a aparente monotonia e a severidade do meio de expressão que domino agora, de maneira definitiva, são ainda o melhor filtro para todas as minhas aventuras espirituais. Mas os exemplos históricos – se, porventura, em matéria de criação espiritual, é lícito determo-nos perante exemplos de qualquer espécie – são todos contra mim.

Cesare Pavese em Ofício de Viver

Sem comentários: