Chegámos ao fim das
cartas que Mário-Henrique Leiria escreveu a Isabel, a Maruska bonita, o seu
mais profundo e silencioso amor, ele que tantos teve.
Este livro, Depoimentos Escritos, é um livro
notável.
Os lampejos que,
desde Julho do ano passado, por aqui fui deixando não reflectem a ternura, a
raiva, a ironia, a maldade nas palavras que dirigia à mãe e à tia, as suas
«velhas», o apuramento da memória que a solidão sempre lhe trouxe.
Conheci
Mário-Henrique Leiria, antes do 25 de Abril na redacção do jornal República.
E nunca mais fui o
mesmo!
É provável que a
E-Primatur, que está a publicar a obra completa de Mário-Henrique, inclua estas
cartas que constam de Depoimentos
Escritos.
Já estão publicados
dois volumes e são livros que aconselho vivamente.
Por favor, dêem algum
desconto à admiração desmedida que tenho por este rapaz amante de gin, mas
leiam.
Amor perdido
O teu ABC fez-me chorar de raiva. Para descontrair os nervos grilados
por não te poder bater e beijar ao mesmo tempo, por apenas imaginar os
“netos/netas” para quem escreveste o teu magnífico ABC bebi o resto da vodka
enquanto o Vodka me lambia s mãos tão doridas, meu amor, tão doridas. Já não
posso escrever senão na máquina que o teu bom coração me mandou.
Mas diz-me Isabelinha que estavas a fazer escrevendo poemas às 6 da
manhã? Devias estar na cama com o teu marido – desculpa já me esquecia que na tua
deliciosa frase não há “comunhão de camas”…
Gaita! Mas espera guerrilheiro velho não abandona as armas… e então
pensei responder ao teu poema com um não meu, não estou com veia, mas
electrónico!!! Eu sei… tu, a clássica vais ficar arrepiada e empandeirada de
fúria. Melhor, ficas mais bonita para a filhada e o marido. Fui a casa de um
amigo depois da tosga ter aclareado e ele tem um computador americano e com ou
dois dedos que não me doíam comecei a escrever e aí vai o resultado. Desculpa a
papelada mas sei que tens a mania de colecionar papéis e outras antiguidades.
Não faz sombra ao teu ABC mas foi tudo o que se conseguiu numa noite e mais uma
manhã de criação electrónica. Valha-me Deus e que ele te acompanhe, na árdua
tarefa de me leres.
A saúde não dá, não dá mesmo embora tu e o teu Pai façam tudo por me
manterem medicado. Se pudesse ia à bruxa… mas aqui, não há a Inquisição, masi a
PIDE, mais o 25 da abrilada matou tudo…
Não te preocupes… ainda tenho o telefone se não puder mesmo a arrastar
a caneta.
O meu enorme amor de sempre vai para ti, meu Amor, com um beijão à
meninada e um abraço ao camarada John
Mário-Henrique
Legenda:
Mário-Henrique Leiria com Natália Correia, Cruzeiro Seixas, Mário Cesariny de
Vasconcelos
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