segunda-feira, 13 de agosto de 2018

CHUVA


Vamos acordar de manhã e estar mortos. Será tudo ainda mais leve e perguntarás: «Queres o pequeno-almoço?» E eu, mais tarde: «Daremos parte do acontecimento aos nossos amigos?» E tu: «Quais?»
Não nos será difícil descer a rua. Vamos então lembrar-nos de que é mês de Agosto, em Lisboa, apesar do chuvisco suíço.
«Quantos dedos tem a chuva? Muitos?»
«Cinco», digo.
«Só?»
«Em cada mão.»
«Apanha-se bom ar». Pego os teus dedos com desapego. Dedos de yoga.
Iremos. Leves. Em simpatia térmica com tudo. A paz finalmente. A administração frugal: excepcionalmente banal, como a saudade de corpo e alma sem regresso e sem perspectiva além dessa rua longa, estreita, irregular, de natureza boa e segura.
Continuará a chover mas não vamos ficar molhados. As frases curtas, sempre mais curtas. Mais curtas. Curtas.
Acabo a perguntar: «Escrevo tudo isto?»
Escrevo no meio da cidade silenciosamente percorrida, com chuva a cair nas artes gráficas.

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