Os Possessos
Peça em 3 actos
adaptada do romance de Dostoievski
Albert Camus
Tradução: Armando
Ferreira
Livros do Brasil,
Lisboa s/d
Virguinsky –
Lipoutine vai muito longe porque desespera de um dia chegar a ver o triunfo das
nossas ideias. Eu creio que é preciso começar pelo princípio e abolir os padres
ao mesmo tempo que a família.
Gaganov – Meus
senhores, eu compreendo todas as brincadeiras… mas abolir de uma só vez o
exército, a marinha, a família e os padres, não! Ah! não… não.
Stépan – Mas não faz
mal algum tratarmos disso. Podemos falar do que quisermos.
Gaganov – Mas acabar
assim com tudo dessa maneira, d uma só vez só, não! Ah! não, não…
Lipoutine – Vejamos;
não acha que é preciso reformar a Rússia?
Gaganov – Sem dúvida.
Nem tudo está perfeito entre nós.
Lipoutine – É preciso
portanto desmembra-la.
Stépan e Gaganov – O
quê?
Lipoutine –
Exactamente. Para reformar a Rússia, é necessário torná-la uma federação. E
para a federar, é precisos primeiramente desmembra-la. É matemático.
Stépan – Isso merece
ser reflectido.
Gaganov – Eu… Ah!
Não, não, eu não me deixo levar com essa facilidade.
Virguinsky – Para
reflectir, é necessário tempo. E a miséria não espera.
Lipoutine – É preciso
começar pelo mais urgente. E o mais urgente, antes de mais nada, é que toda a
gente tenha que comer. Os livros, os salões, os teatros ficam para depois, para
mais tarde… Um par de botas vale mais que um Shakespeare…
Stépan – Ah! Não pode
ser! Eu não consinto em semelhante coisa! Não, não meu bom amigo; o imortal
génio brilha acima dos homens. O mundo todo que ande de pés descalços mas não
se toque em Shakespeare…
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