A minha longa doença nos começos da vida, a actividade clandestina,
sempre embora na legalidade, o muito trabalho sempre, tudo isso deixa marca e
deve ser responsável de um estilo de vida que há--de parecer meio monástico e
muito pouco agradará aos nadadores de aquário. Mas ouriço, eu?
Depois do 25 de Abril, com a euforia geral e a minha em particular (como era bom falar com toda a gente em qualquer parte!, ver que afinai isso é possível!), voltei a dar-me mais, a dar-me todo: artigos, entrevistas, discursos, reuniões, frenéticos trabalhos de organização e mobilização na escola, no Ministério, até na RTP, essa cabeça perigosa que também pensa por «milhões de cérebros». Pertenci até, embora por pouco tempo, na excelente companhia dos profs. Torre de Assunção e Ário de Azevedo, à Comissão de Saneamento do Ministério da Educação. Não há razão para ocultá-lo. Apesar do que diz uma linguinha que anda por aí escorrendo baba e devia ser cortada. Pedira-me um velho amigo, então ministro, o Vitorino Magalhães Godinho, que aceitasse a espinhosa e trabalhosa missão. E a verdade é que alguém teria de dispor--se a aceitar certas tarefas, por mais ingratas e difíceis. Ou a Revolução se defendia, ou nunca chegaria a sê-lo. Como não chegou. Mas pouco ali mais fiz do que arrumar a casa, que encontrei em perigoso desalinho. Pelo menos, nunca mais ninguém levou processos para casa nem lhe deu tratamento ao sabor de preferências pessoais ou partidárias. Mal verifiquei, porém, ser indispensável alterar uma lei que castigava os pequenos (reles informadores, outros que tais) e protegia os grandes responsáveis e que o Conselho de Ministros nem queria ouvir falar em tal, tanto eu como o companheiro exemplar que era o prof. Torre de Assunção, apresentámos o nosso pedido de demissão ao Ministro, que entretanto mudara.
Depois do 25 de Abril, com a euforia geral e a minha em particular (como era bom falar com toda a gente em qualquer parte!, ver que afinai isso é possível!), voltei a dar-me mais, a dar-me todo: artigos, entrevistas, discursos, reuniões, frenéticos trabalhos de organização e mobilização na escola, no Ministério, até na RTP, essa cabeça perigosa que também pensa por «milhões de cérebros». Pertenci até, embora por pouco tempo, na excelente companhia dos profs. Torre de Assunção e Ário de Azevedo, à Comissão de Saneamento do Ministério da Educação. Não há razão para ocultá-lo. Apesar do que diz uma linguinha que anda por aí escorrendo baba e devia ser cortada. Pedira-me um velho amigo, então ministro, o Vitorino Magalhães Godinho, que aceitasse a espinhosa e trabalhosa missão. E a verdade é que alguém teria de dispor--se a aceitar certas tarefas, por mais ingratas e difíceis. Ou a Revolução se defendia, ou nunca chegaria a sê-lo. Como não chegou. Mas pouco ali mais fiz do que arrumar a casa, que encontrei em perigoso desalinho. Pelo menos, nunca mais ninguém levou processos para casa nem lhe deu tratamento ao sabor de preferências pessoais ou partidárias. Mal verifiquei, porém, ser indispensável alterar uma lei que castigava os pequenos (reles informadores, outros que tais) e protegia os grandes responsáveis e que o Conselho de Ministros nem queria ouvir falar em tal, tanto eu como o companheiro exemplar que era o prof. Torre de Assunção, apresentámos o nosso pedido de demissão ao Ministro, que entretanto mudara.
Luta tenaz, tão sincera como ingénua: os abutres estavam lá, na sombra
ainda. Uma luta, como sempre, assente em dois pontos principais: cultura e
unidade. Não me chegara a lição da vida inteira. Lutava contra moinhos, contra
o vento.
Mário Dionísio em Autobiografia
Legenda: Mário
Dionísio no Sanatótio do Caramulo (1970), fotografia tirada de Autobiografia
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