sábado, 27 de abril de 2024

O OUTRO LADO DAS CAPAS


Não lembro como, quando e onde, terei comprado este exemplar dos Cadernos de Circunstâcia. Com toda a certeza foi antes de 25 de Abril e dentro daquele espírito de que tudo o que fosse contra a ditadura comprava e porque o  meu pai sempre foi da opinião que devíamos ler tudo.

É um caderno composto a stencil.

Nas suas 70 páginas pode ler-se uma frase lapidar de KarlaMarx: «A emancipação dos trabalhadores será a obra dos próprios trabalhadores» e a conclusão que «só nestes termos será possível à classe operária e aos seus aliados apoderarem-se do aparelho de estado instituindo a ditadura do proletariado.»

José Pacheco Pereira, no seu livro «As Armas de Papel» diz que estes cadernos eram produzidos em França, (1967 e 1970) da responsabilidade de Aquiles Oliveira, sediados em Arcueil.

«Era distribuída [entre 1967 e 1970] em França e nos círculos de emigração, e enviada para Portugal através de oficiais da Marinha portuguesa que passavam nos portos franceses (dois dos seus membros, Jorge Valadas e João Freire, tinham pertencido à Marinha) e dos contactos dos membros do grupo com o interior do país. Entre esses contactos contava-se José Leal Loureiro que levava a revista para o Porto, e um conjunto de ligações de José Maria Carvalho Ferreira que transportava a revista para o interior do país no seu ano final. Em Lisboa, distribuíam a revista António Viegas, Artur Pais, Mário Kruger, Carlos Miranda, Ilídio Ribeiro e João Martins Pereira. A revista penetrava também no interior através dos contactos dos estudantes e intelectuais radicais que se deslocaram a Paris nos anos 1968-1970.

Os Cadernos de Circunstância foram a revista mais influente no plano político-intelectual publicada na emigração, introduzindo nos seus textos uma atenção analítica que não era comum, assim como uma aproximação interdisciplinar e uma fundamentação estatística que traduzia as preocupações intelectuais dos seus autores.

A motivação inicial da revista em 1967 resultava da insatisfação com os moldes da oposição ao regime salazarista, quer por parte do PCP quer dos grupos maoistas que tinham sucedido à FAP. Manuel Villaverde Cabral tinha tido a dupla experiência de ambos e entendia que era necessária muito mais «informação objectiva e firmeza ideológica.»

Pacheco Pereira escreve ainda que após a chegada ao poder de Marcelo Caetano, publicaram um panfleto sobra a queda de Salazar da cadeira em Setembro de 1968, que Álvaro Cunhal atacou os Cadernos no seu livro contra o esquerdismo, que a revista influenciou O Tempo e o Modo e que o grupo autodissolveu-se, sem crise nem zanga, depois da publicação do número 7, em 1970.

Na Biblioteca da Casa apenas existe este exemplar do 1º número dos Cadernos de Circunstância.

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