Dois dos mais importantes intelectuais
portugueses, José Rodrigues Miguéis e Jorge de Sena, viram-se na obrigação de
emigrar para poderem sobreviver e escrever. Isso tornou-os homens amargos,
muitas vezes à beira do desespero.
Mesmo longe, sentiram-se sempre perseguidos
pela ditadura salazarenta.
E não só!
Pelos seus pares que não apoiavam o regime,
também se sentiram injustiçados e marginalizados.
Num texto «A Literatura Portuguesa no
Secundário», publicado na revista do Expresso,
10 de Junho de 2017, Diogo Ramada Curto revela:
Por isso, releio
esta minha denúncia acerca de um programa escolar da nossa literatura tendo à
minha frente os papéis de Rodrigues Miguéis e o seu dossier sobre uma antologia
do conto português (Hay Library, Universidade de Brown). Verifico que também
ele hesitou – e não foi pouco – nos autores a incluir e nas relações a
estabelecer com a literatura brasileira. A antologia organizada por Miguéis
estava para ser traduzida pelo seu amigo Raymomd Sayers, professor de
Literatura. Dados os custos envolvidos, o editor pediu um subsídio, em 1961. A Fundação
Gulbenkian disponibilizou-se para apoiar a edição. Mas, segundo o dossier da
John Hay Library, terá imposto uma condição: que o nome de Miguéis não
figurasse como coautor da antologia. Uma hipótese plausível, destinada a
explicar este ato de censura, é que a sombra das suas ligações ao Partido
Comunista – mau grado a distanciação adotada por Miguéis, desde a Segunda
Guerra. No seu longo exílio em Nova Iorque – continuava a apesar. O livro nunca
saiu e a história da literatura portuguesa, pelo menos a sua difusão em língua
inglesa, ficou mais pobre.
Salazar, juntamente com os crápulas que o
apoiavam e veneravam, sempre viu comunistas em tudo e em todos. De tal ordem
que chegaram ao ponto de inventar Fátima para que o mundo ficasses livre do
Comunismo
Pego em José Rodrigues Miguéis, Vida eObra, de Mário Neves, e reproduzo:
Se José Rodrigues
Miguéis tinha então algum compromisso com o sector comunista não está
devidamente averiguado, nem é muito fácil sabê-lo, dada a confusão em que tais
coisas se processavam, nessa época de cautelosa clandestinidade. Em
averiguações posteriores, ao pretender-se identifica-lo no quadro político da
época, discutiu-se esse ponto, embora não pudessem restar dúvidas das suas
simpatias pelos princípios defendidos pelo Partido Comunista e que se traduziam
em frequentes atitudes de empenhada militância. As diligências feitas com vista
a um esclarecimento nesse sentido deparam todos, porém, com informações nem
sempre convergentes. Ao passo que as pessoas responsáveis da direcção do
partido afiançam que Miguéis foi mesmo filiado, Camila Campanella, a esposa e
companheira dedicada do escritor, que com ele conviveu dezenas de anos e
conheceu os mais íntimos aspectos da sua carreira, afirma perenptoriamente que
não. Por sua vez, Ana Maria Alves, num estudo em que analisou criteriosamente a
posição de «Miguéis seareiro», escreve: «É possível que Miguéis tenha estado
ligado ao Partido Comunista, mas é difícil ponderar o grau e o significado
desse comprometimento, já que o PCP é, nesta época, uma pequena organização
muito fluida e de ideologia confusa.» Ainda num trabalho recentemente publicado
na Análise Social, sob a responsabilidade de Luís Salgado de Matos, o militante
anarco-sindicalista Emídio santana, que muito se ocupou desses temas, por
curiosidade histórica e interesse partidário, não hesito em afirmar que Miguéis
«esteve ligado ao PC».
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